De fato, eu não me imaginava mãe. Trabalhava como executiva em uma empresa e ministrava aulas em uma escola de nível superior à noite. Porém, eu sempre quis ser mãe e, também, que o meu bebê tivesse uma família constituída.
Em 2010, conheci o Anderson e começamos a namorar. O tempo passou. Nós sempre pensamos em ter um filho. Como já tinha quarenta anos de idade, optei por realizar um exame de sangue que testa fertilidade. O resultado foi que eu tinha menos de 9% de chance de engravidar. Não tinha mais esperança de ser mãe biológica. Então, conversamos e decidimos que a adoção poderia ser uma opção para a nossa vida. Marcamos, então, o casamento para o final daquele ano, no dia 01 de dezembro de 2012.
Em 04 de abril, comentei com meu marido que o meu ciclo menstrual estava atrasado e ele não deu muita importância. Pensávamos que era apenas mais um atraso, devido à realização da cirurgia de redução do estomago, a pouca gordura no corpo e o stress do exame de fertilidade. Porém quando ele colocou a mão na minha barriga, senti algo muito estranho e diferente. Decidi fazer um exame de sangue porque não achei que um teste de farmácia bastaria. Acho que foi a única vez que eu, realmente, fiz uma surpresa para o meu marido.
Em 05 de abril, saiu o resultado. Era uma quinta-feira santa. O meu marido estava chegando do trabalho. Nunca vi um rosto tão iluminado e uma alegria genuína unida com descrença total. Mesmo se tentasse, eu não conseguiria reproduzir a emoção que vi naquele rosto.
Passamos por uma consulta para verificar se estava tudo bem com a gestação do nosso bebê. O resultado não poderia ter sido melhor. Estava tudo bem com o feto. Então, saímos de lá radiantes! Nossos amigos mandavam mensagens, estavam comemorando e muito felizes por nós. Era uma excelente notícia.
Marcamos, então, oura consulta com a ginecologista/obstetra, a mesma que solicitou o teste de fertilidade, que acompanharia toda a gestação. Ela solicitou que eu fizesse o ultrassom na semana do dia 25 de abril, porque já estaria com 12 semanas de gestação e precisaria realizar o exame morfológico. Eu não sabia da importância do exame morfológico. Aliás, não sabia detalhes dos exames e nem da importância de realizá-los.
Fui orientada a realizar o exame em um laboratório da confiança da minha médica. A minha grande preocupação na época era que não havia levado um DVD para gravar o ultrassom para que o meu marido, que não pode ir por questões de trabalho, acompanhasse os detalhes. Meu desespero foi quando o médico, passados cinco minutos do exame, disse que neste momento, ao sair da clínica na Espanha, mães são encaminhadas para uma clínica de aborto (lá legalizado). Eu não entendia o que ele dizia. Eu estava em prantos e pedia maiores explicações. Ele me disse que a translucência nucal apontava 4,1 mm. Explicou que para um feto “normal”, essa medida não podia ultrapassar a 1,1 mm, o que indicava 70% de chance de o meu bebê ter síndrome de down. Disse, também, que, provavelmente, meu bebê era uma menina. Fiquei apavorada. Apenas chorava. Eu não conhecia ninguém que tivesse um bebê ou filho com síndrome de down. O que sabia ou lembrava era apenas algo visto na televisão.
Assim que sai do consultório, liguei para o meu marido que, sempre tranquilo e otimista, me disse que nosso filho não teria nada e que era perfeito. No caminho de volta para casa, que para mim parecia não ter fim, eu chorava e rezava. Então, lembrei que chorar não ajudaria em nada o meu bebê, que não entendia nada do que estava acontecendo. Então, pela primeira vez, eu disse “Sophia, está tudo bem, a mamãe está um pouco preocupada, mas está tudo bem”.
Retornamos à obstetra, que me solicitou o exame cariótipo para reconfirmar o resultado, uma vez que o morfológico podia não ser conclusivo. Eu não sabia que o exame era tão evasivo, a ponto de a mãe ser obrigada a assinar um termo de responsabilidade e ciência de que corre o risco de abortar. Claro, que, por orientação da minha médica, assinei o documento e realizei o exame. Por ser um exame muito detalhado e complexo, o resultado foi previsto para 25 de maio. Seria uma longa espera.
No dia, sem ter recebido uma ligação ou resposta da médica ou do laboratório, decidi acessar o portal. Eu me surpreendi, entrei em pânico e me desesperei. No exame, o resultado confirmava que realmente se tratava de uma gestação com trissomia 21 e que seria uma menina. Uma mãe nunca espera que seu bebê tenha algum problema. Saber o resultado por e-mail foi muito traumático. Eu estava em casa sozinha. Eu chorava e gritava. Liguei para o meu marido e disse que nosso bebê tinha síndrome de down. Então, eu perguntei a ele “vamos ter nosso bebê, não é mesmo?” e ele respondeu “claro que sim”.
Minha família estava reunida em casa. Chorávamos muito. Minha mãe, sábia como sempre, sugeriu que rezássemos para acalmar nossos corações. Naquela mesma noite, recebi uma mensagem do meu marido que confesso, mesmo que ele tente, acredito que nunca enviará outra mensagem tão doce, tão apaixonada como aquela que dizia:
“amo mais vocês hoje que ontem, vocês são as mulheres da minha vida, amo vocês”.
Acredito que nosso “luto” durou mesmo um dia. Ele chegou do trabalho, naquela época trabalhava no turno da noite, e trouxe alguns doces e salgados para tomarmos o café da manhã. Nós nunca tivemos uma refeição tão silenciosa e ao mesmo tempo tão gritante. Essa mistura de sentimentos mostrava exatamente o que sentíamos naquele momento. Não conhecíamos nada, não sabíamos nada.
Apesar de não sabermos o que ia acontecer, recebemos o apoio de toda família. Decidimos que tínhamos que nos preparar da melhor forma, para poder cuidar bem da nossa Sophia. Minha irmã Silvia conhecia um professor com uma filha portadora da síndrome de down e ele se dispôs a falar conosco. Como trabalho em uma instituição de ensino superior, pedi ajuda aos profissionais da área da saúde para me orientarem. Um professor me indicou uma amiga geneticista e pediatra que poderia nos instruir e ajudar a nos preparar para termos uma gestação controlada até o nascimento do nosso bebê.
Marcamos uma consulta para o dia 18 de julho. A médica foi muito atenciosa e procurou, de maneira clara, informar tudo o que poderia acontecer durante a minha gestação e no nascimento da Sophia. Ela solicitou vários exames essenciais que deveriam ser realizados ainda antes do nascimento. Ficamos no consultório por mais de duas horas e meia
Casamos-nos no dia 28 de julho e no dia 31 de julho fizemos, em minha opinião, um dos exames mais importantes, o de coração, para saber se a Sophia teria cardiopatia. Apesar do golf ball, típico da síndrome de down, a Sophia não teria cardiopatia, estava tudo tranquilo com ela. Recebemos o melhor “presente” de casamento que poderíamos ganhar.
O nosso bebê nasceu prematuro, no dia 06 de outubro de 2012, às 03h36min, com um plantonista do hospital. Eu tinha tanto medo que algo desse errado, que ela ainda não estivesse pronta para nascer, poderia ser ainda pior. Nossa, tanta coisa passava pela minha cabeça. Porém, lembro-me da voz da plantonista me dizendo “Mãe sua filha vai nascer agora, é o que ela quer, vai dar tudo certo”. Então, em 11 minutos nasceu o bebê mais lindo deste mundo, a nossa tão amada Sophia.
Danieli Hernandes Ferraz
4 Comentários
Jose Carlos
16/10/2016 às 13:25Danieli e Anderson,
A história de vida de vocês revela o que é o verdadeiro amor. Esse amor que transcende barreiras, supera todos os obstáculos.
Parabéns, a Sophia é linda, e tenham a certeza que ela dará muita alegria a vocês. A Sophia é iluminada por Deus.
Luzia Jailka Barbosa de Melo Reginaldo
17/10/2016 às 13:09Nossa muito linda sua história, fiquei emocionada, acho que na maioria, nossas histórias são parecidas, primeiro momento vem o medo por n conhecer a Síndrome de Down, e depois vem a alegria de ser escolhida a ser mãe de um ser tão iluminado, sou mãe do Cauã e muito grata a Deus por ter me dado a dádiva de ser a mãe dele, um grande bjo e tamos juntas e misturadas…..
Jessica Ramos
19/10/2016 às 02:34Muito linda sua história, isto só reflete a mulher maravilhosa e forte que a senhora é, e a linda Sophia trará o dobro da felicidade que já te dá… admiração é o que resume a todos que te conhecem.
Lo Ami Mello
30/10/2016 às 14:10“O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.”
Eu sempre sempre tive uma admiração por você como professora e como pessoa e agora mais ainda como Mãe. Que história Incrível! Fico imensamente feliz por ver seu desejo compartilhado comigo e com a Gabi naquela manhã, quando fomos falar sobre o tema escolhido pro nosso TCC, se tornando realidade e cada dia vem dando mais certo. Você é muito abençoada e creio que é só o começo de um longo caminho. Sucesso!